Contestatária, refilona, pessimista. Mafalda, a personagem de banda desenhada criada pelo argentino Quino, celebra 50 anos, desde que apareceu no jornal Primera Quem não se lembra dela ponha o dedo no ar. Ora aí está. Todos se lembram.
Apesar de ter sido criada em 1962, para a promoção de uma gama de electrodomésticos, a famosa personagem de banda desenhada só apareceu pela primeira vez – carrancuda, com farta cabeleira negra – a 29 de Setembro de 1964, no semanário argentino Primera Plana.
Filha de uma família da classe média argentina, Mafalda questiona a Humanidade e a existência da sopa, de dedo em riste e quase sempre com um ar preocupado. Uma “heroína zangada que recusa o mundo tal como ele é”, descreveu Umberto Eco em 1969.
Quino (Joaquin Lavado) foi publicando as tiras de BD da Mafalda – e de uma galeria de personagens que inclui Manelito, Filipe, Susanita, Miguelito, Liberdade e uma tartaruga chamada Burocracia – ao longo de nove anos e em vários jornais, ao mesmo tempo que mantinha o trabalho no desenho gráfico de humor.
Contra a maré de sucesso, o autor decidiu não mais publicar as tiras semanais a 25 de Junho de 1973, abrindo excepções para pedidos especiais, como quando desenhou Mafalda, em 1977, para uma campanha da UNICEF para os direitos das crianças.
Hoje, aos 82 anos, Quino sublinha que já desenhou tudo o que tinha a desenhar sobre Mafalda. Fica a obra, que, apesar de uma ou outra ruga da passagem do tempo, continua actual porque “o mundo é o mesmo”.
Cinquenta anos depois, Mafalda continua menina e refilona e pode ser lida em tablets e telemóveis, está no Facebook, no Twitter e no Instagram e traduzida em vinte línguas.
Em Portugal, Mafalda foi publicada pela primeira vez em 1970 e desde então saíram várias edições especiais.
Em Outubro, a Verbo lançará ‘Toda a Mafalda – Edição comemorativa dos 50 anos’, que inclui as tiras de BD, artigos de opinião e textos que enquadram a obra de Quino e que abordam a edição em Portugal, explicou Maria José Pereira, daquela editora.
O livro, com 600 páginas, contará ainda com uma biografia actualizada de Quino, que inclui já o Prémio Príncipe das Astúrias de Comunicação e Humanidades, conquistado em maio.
“A Mafalda é uma personagem dos anos 1960/1970, de um contexto histórico inegável, mas está muito actual, porque as questões são as mesmas, os países são os mesmos. As preocupações não mudaram”, disse Maria José Pereira.
Apesar de Quino ter estado várias vezes em Portugal, a editora não se recorda de Quino ter feito referências ao país na sua obra.
Em Abril em Buenos Aires, Quino afirmou que o seu desejo é que as novas gerações entendam – tal como há 50 anos – a mensagem da banda desenhada da Mafalda. “Que os seres humanos se entendam melhor e nos deixemos de tratar tão mal o planeta”.